quinta-feira, 26 de maio de 2011

À sombra do mundo

I

Se levanta e me diz como tem sido a sua vida.
Dos dias tristes e solitários eu já soube,
Conheci-os há tempos.
E embora o tempo pareça curto
Seremos seres insaciáveis pra sempre.

A gente vive buscando conquistas douradas,
o apelo ao trabalho,
a fixação de alguns por dinheiro.
Porém isso não é tudo:
há uma vida para ser vivida lá fora.

Ultimamente tenho andando meio desanimado
Meio inteiro, meio metade.
Me perco em minha inutilidade e tudo em mim parece estar acabado,
Os sonhos do passado transformados em lembranças do presente,
As ideologias de outrora reduzidas ao imaginário.

À sombra do mundo gritei um protesto tímido
Em desacordo com a ordem das coisas já estabelecidas.

A realidade tem sido distorcida
A mídia não te leva a pensar
A indústria lhe quer pra consumir
E o sistema, pra lhe esgotar:
Sóis braços e pernas,
trabalho e consumo.

Não que eu não faça parte do ciclo
Ou que eu sigo por caminhos absurdos,
Mas são as diferenças que nos fazem tomar rumos diferentes.
Pois há tantos caminhos, tantas indecisões
Muitas perguntas para poucas respostas.

Enquanto muitos se desperdiçam
Há os que estão tramando as manhãs.

II

Paro e vejo que a massa é unânime:
não olhe para trás, não faça perguntas, não busque respostas, não queira ser capaz, não tente voar, não tente fugir, não tente gritar, pois as garras que te prendem são tão longas e os ouvidos já estão dopados o bastante para te ouvirem e então tudo será em vão, apenas siga a estrada até quando o corpo agüentar.

Mas sou
E participo dos fatos
Mesmo estando à parte
Do resto do bando.

À sombra do mundo conheci o que é a contramão.
De mãos vazias, corpo delicado e o coração cheio.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Sobre o tempo

Querida,
Não cante as suas tristezas, nem celebre suas lamentações.
Não tente fugir do tempo ou se esconder do mundo:
Nenhum lugar é tão seguro que não poderão te achar.
A vida é assim e a solidão a sua maior companheira
Por isso não despreze o que sente porque sofrer é estar vivo
E chorar a forma mais simples de aliviar a dor.

Os dias lhe trouxeram alegrias e desilusões
Mas não se assuste: muitas outras virão!
Estamos apenas no começo:
Ainda passaremos muitos invernos sentindo o frio chegar e tocar nossa pele
Em carícias perversas aquecendo nossos corpos
Enquanto tudo lá fora é vento e solidão.

Bem,
Eu sei que as semanas têm sido longas e os dias se parecendo uns com os outros .
Não é novidade a depressão que sente no domingo
Realmente o início da semana nos assusta
(até os cães ficam deprimidos na segunda-feira)
Mas isso não é motivo para parar e rejeitar a dança.
Ainda estamos em Maio, mês das mais violentas e displicentes paixões.
Período em que muito se mata e morre
Em mortes pequenas,
Crimes delicados que nos ajudam a viver.
Por isso não se assuste com o que ver na televisão:
As notícias são sempre as mesmas enquanto o ciclo se repete.

Mas querida,
Saiba que eu ainda estou aqui.
Que você mudou e que eu mudei, disso eu sei.
Meu rosto já não esboça os mesmo traços que outrora
Nem meu corpo é como antigamente:
Agora há as novas falhas, outras marcas,
Prova de que o tempo está passando e deixando o seu rastro em meu corpo.
E nós sabemos que é assim,
Pois se ainda sou o filho, breve serei o pai e mais adiante o avô.
O importante é celebrarmos a mocidade, pois ela ainda não está perdida.
Somos tão jovens que às vezes parecemos bobos.
Mas nós sabemos que é assim,
E que o tempo passa rápido demais pra nós o desperdiçarmos com coisas idiotas como fazíamos ontem.

O nosso futuro já não é o mesmo
Nem o passado foi como eu queria
Mas ainda há o presente
Por isso, querida, não se desespere
Ainda estamos no começo.

segunda-feira, 2 de maio de 2011

A nossa casa

De pouco em pouco fomos construindo a nossa casa
Trazendo pra dentro tudo o que pudesse nos servir
E que nos fizesse apenas estar:
Um olhar, um abraço ou um sorriso
Pra habitar os espaços e nos preencher de cumplicidade
Para que as mãos pudessem permanecer juntas
E a saudade não vir nos visitar.

Você usava minhas roupas e preparava o café
Enquanto eu saia e só pensava na hora de voltar
Porque em casa eu estava seguro dos abismos do mundo
E das crueldades dos desejos e das necessidades.

Você me falava sobre o seu medo da vida
E do que mais ela poderia lhe trazer e tirar.

Esperava o fim de semana para irmos ao parque
E sob a sombra das árvores lembrar como foi a semana
Deixando o tempo passar.

Eu lhe dedicava poemas e outros desenhos para expressar o que eu sentia.
Você me dava presentes e dizia como tudo estava indo bem.

Eu cuidava das flores e as regava dando cores ao nosso jardim.
Você preparava o jantar e me matava pela boca.

Mas o tempo é pouco quando se ama
E em alguma hora tudo se desata
E desfaz-se o nó.

Outrora alguém dizia para eu ter cuidado
Que a nossa intensidade poderia me machucar.