quinta-feira, 19 de agosto de 2010

Das vezes e procuras

Das coisas que se perderam nas esquinas dos dias
a tua lembrança é o que mais dói.

Das camas em que dormíamos
dos bares que frequentávamos
e das tantas vezes que sorríamos:
a boca escancarada era a alegria que transbordava
pelo teu rosto retorcido.

Das vezes que pela madrugada te procurei
e daquelas que não te encontrava
mais eu me perdia, mais eu me calava:
Eu sabia da solidão.

Teus passos a minha conduta,
os nossos encontros a minha redenção.

Tu éras a comida
o pão que alimentava e saciava
a fome que muitas vezes eu nem sentia:
Tu eras a anestesia.

E eu me agarrava aos teus braços
e tu pedias a minha companhia
pois não querias ficar sozinha:
Tu sabias da solidão.

quinta-feira, 12 de agosto de 2010

Baladas de inverno

Eu hoje nem dormi
e enquanto a madrugada ventava escurecida
alguns amigos apareceram
feito luzes que se acendem ao anoitecer
trazendo brilhos nos olhos e gritos na garganta
com copos cheios de alegrias instantâneas
que transbordavam na sala de estar.

Sentados no sofá estávamos
e o que não queríamos
era deixar a noite passar
em branco.

Em contraponto ao escuro do céu
as nossas alegrias dançantes
ao som de acordes que tamborilavam
nos ouvidos as vozes cantantes
que não queriam dormir.

E mesmo assim,
sua mão estava ali, inchada de tanta bebida
agarradas as minhas, que inquietantes
tocavam as suas.

E tu me pedias
uma roupa emprestada
pois querias ficar.

Baladas de inverno
embaladas ao vento.

domingo, 8 de agosto de 2010

Confins de agosto

Depois da noite de festa,
com os olhos de ressaca
e a boca seca,
fez-se agradável a tua presença
um tanto quanto indispensável
para os beijos amargos
temperados pela maresia
das conversas a esmo
dos teus braços persuasivos
da minha vontade calada
de estar contigo por mais um instante.
E depois das bebidas,
sentados na areia para ver o sol nascer,
despreocupados, consolados,
sabendo de como é a vida
das partidas e chegadas,
dos beijos e abraços
que se perdem e se encontram por aí,
eu a beijava.
E foi me perdendo que eu encontrei
a tua presença no final desta linha
linha que um dia foi minha
linha que um dia foi tua.
E de repente, sem muito o que dizer,
as palavras se calaram,
e a boca se calou.
E me vi outra vez me despedindo
de alguem que estava partindo
antes mesmo de chegar.
De ver acabar o que mal começou.
Com um adeus desconsolado,
com palavras amargas, um tanto
quanto doídas por ver alguem
assim partir antes mesmo de chegar.
E desta estória ficam as lembranças,
assim como sempre é, daquelas coisas
quase oníricias, breves, bravas,
passageiras (somos passageiros).
Dos olhos verdes que clarearam a noite escura,
dos passos certos que me guiaram na escuridão,
de alguem que partiu antes mesmo de chegar,
e de ver acabar o que mal começou.

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

Devaneios de inverno

O tempo está fechado:
no meu ouvido
o vento friamente uiva
suas melancolias
e tristezas
feito um lamento
de quem padece.

E nessas intempéries
sem responder a nenhuma pergunta
o pó se desvaneceu.

Andei passeando por jardins
e vi suas estátuas de lama
em meio ao manguezal.

Vi o sol morrer
e a noite entalhar
as suas formas
na escuridão.

Nessa valsa triste
senti a febre arder
como crianças brincando
com o fogo
como crianças brincando
com facas
como facas acariciando
a pele.

Lúgubres sinfonias de inverno
que você regia para mim.

Enfim, devaneios de inverno.

domingo, 1 de agosto de 2010

O enlace

O vento sopra
e move o cabelo
contra o rosto
da menina deitada
nua sob o sol

A língua cortando a pele
enquanto seus beijos cortam o dia

Na longitude dos lençóis
você se perde
e me leva contigo
pra algum lugar distante

Por alguns instantes
me vejo eterno.